Projetos para rotular transgênicos chegam ao Congresso dos Estados Unidos
por Carey L. Biron, da IPS
Washington, Estados Unidos, 26/4/2013
– O esforço de uma década nos Estados Unidos para rotular os alimentos com
ingredientes geneticamente modificados recebeu um impulso significativo esta
semana, com a entrada nas duas casas do Congresso de dois projetos de lei. É a
primeira vez que uma iniciativa deste tipo é apresentada no Senado em mais de
dez anos, período em que o uso de organismos geneticamente modificados aumentou
de forma exponencial. Caso sejam aprovados, os Estados Unidos se unirão aos 64
países no mundo que já contam com normas e leis semelhantes.
“Os norte-americanos têm direito de saber o que contêm os alimentos que
ingerem, para tomarem melhores decisões em relação às suas famílias”, afirmou a
senadora Bárbara Boxer, do governante Partido Democrata, após a apresentação
dos dois projetos no dia 24, dos quais é defensora. Boxer também foi autora de
uma proposta de característica semelhante em 2000. Na época, o projeto de lei
foi uma iniciativa pessoal e não teve mais apoio. Mas a iniciativa atual já
conta com apoio de nove senadores e 21 representantes, entre os quais dois do
opositor Partido Republicano.
“Este projeto conta com apoio de uma ampla coalizão de grupos de
consumidores, empresários, agricultores, pescadores e pais, para os quais os
consumidores merecem mais, e não menos, informação sobre os alimentos que
compram”, destacou Boxer. Na verdade, parece que a opinião pública está
esmagadoramente a favor do novo projeto, que obrigará a Agência de Alimentos e
Medicamentos (FDA) a solicitar dos fabricantes de comestíveis que rotulem seus
produtos caso contenham organismos transgênicos.
A FDA, vinculada ao Departamento de Saúde, é o principal órgão regulador
dos alimentos. Segundo inúmeras pesquisas realizadas nos últimos anos, mais de
90% dos consultados neste país são a favor de que a FDA exija o rótulo em
alimentos com ingredientes transgênicos. Contudo, durante anos, a própria FDA
rejeitou pedidos semelhantes, apesar de ter autoridade legal para determinar
uma mudança dessas características. Pelo contrário, a política atual continua
sendo a de que os transgênicos não são “materialmente” diferentes dos alimentos
sem manipulação genética.
O fundamento por trás desta postura é que os consumidores não podem
sentir fisicamente a diferença entre os dois alimentos. “Lamentavelmente, a
política antiquada da FDA não acompanha as mudanças tecnológicas do século 21,
que permitem uma vasta variedade de mudanças genéticas e moleculares nos
alimentos, que não podem ser detectados pelos sentidos humanos”, diz uma
declaração da senadora Boxer e do representante Peter DeFazio, que apresentou o
projeto de lei na Câmara de Representantes.
Essa prova não é consistente com as três mil substâncias que a própria
FDA já obriga a rotular. “A questão é que há muito tempo a FDA se dedica à
política e não à ciência”, disse à IPS o diretor para assuntos governamentais
do Centro para a Segurança Alimentar, Colin O’Neil. “Milho que produz seu
próprio inseticida, um peixe que cresce duas vezes mais rápido que o normal, ou
uma maçã que não apodrece em 30 dias, sabemos que são mudanças materiais e que
são alimentos novos”, pontuou.
Há cerca de 15 anos, os consumidores norte-americanos comem cada vez
mais transgênicos, quase sempre sem rotulagem. Vários estudos estimam que quase
dois terços dos alimentos processados vendidos atualmente nos Estados Unidos
contêm grãos com modificações genéticas, em especial milho e soja.
Seu uso começou nos Estados Unidos, mas se propagou a todo o mundo e
agora os cultivos transgênicos ocupam mais de 10% das terras agrícolas. Em
2010, mais de 80% da soja era transgênica. Nos últimos anos, aumentou muito a
preocupação da população com este assunto. Porém, o debate sobre a manipulação
genética costumar ficar parado em discussões sobre o que a ciência concluiu, ou
não, a respeito.
Devido em parte à necessidade de estudos de longo prazo e à relativa
novidade da generalização de seu uso, os resultados das pesquisas apoiam tanto
os partidários quanto os opositores da manipulação genética. De todo modo, os
novos projetos de lei evitam completamente o debate científico, para se
concentrar apenas em questões de informação pública e liberdade de escolha dos
consumidores.
“O governo não rotula os alimentos perigosos, os retira do mercado”,
disse O’Neil. Isto é, “os alimentos não precisam ser perigosos para serem
rotulados”, explicou. “Quando a FDA exigiu que os alimentos irradiados fossem
rotulados, por exemplo, seu argumento não girava em torno das ‘mudanças
materiais’ dos alimentos, mas simplesmente em se os consumidores sentiam que o
desconhecimento do fato os estava enganando”, argumentou.
Sobre o novo projeto, O’Neil disse: “É um avanço muito significativo”
para o movimento a favor da rotulagem. “A indústria infundiu muito medo quando
a senadora Boxer apresentou pela primeira vez (2000) seu projeto de lei, mas o
diálogo mudou drasticamente desde então. Já não se trata de haver ou não
rótulos, mas quando serão exigidos”, concluiu.
Além do apoio público, o novo projeto de lei conta com o apoio crescente
de empresas e governos estaduais. Só este ano, cerca de 50 projetos de lei em
26 Estados pediam a rotulagem de transgênicos. Mais de cem companhias já deram
seu apoio público ao novo projeto de lei federal. Outras tomaram medidas
semelhantes, por exemplo, a rede Whole Foods prometeu, no começo deste mês,
etiquetar todos os alimentos transgênicos que oferecer até 2018.
Sindicatos de agricultores apoiam a iniciativa devido aos obstáculos que
surgiram para a exportação já que os Estados Unidos estão atrasados na matéria.
Na verdade, aprovados os projetos, simplesmente será obrigatório que os
produtores façam para os consumidores norte-americanos o mesmo que fazem para
muitos mercados de exportação.
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